segunda-feira, 24 de junho de 2013

Um conto de Fadas e Sereias

Provavelmente a forma correta de começar este conto seria "Era uma vez uma fada e uma sereia que se apaixonaram sem perceber o como essa ideia era estúpida...", mas seria um péssimo começo por vários motivos.

O principal motivo é que temos uma ideia muito errado sobre fadas e sereias, não acredite em tudo que os contos de fadas convencionais falam para você, embora cada um diga uma coisa. Já ouvi que sereias não têm alma, e ouvi também que fadas só conseguem ter um sentimento por vez... É tudo mentira.

As fadas são filhas do ar, as sereias são filhas da água, os seres humanos são filhos da terra, e as salamandras filhas do fogo.

Se formos simplificar: terra é a matéria, ar é o pensamento, águas as emoções e fogo do espírito.

Mas talvez, o que tenha unido aquelas criaturas tão distantes, foi o fato delas serem tão diferente daquilo que deveriam ser...

Elas eram opostas, mas a oposição nada mais é do que o outro lado de uma mesma moeda. O oposto da claridade é a escuridão e não o silêncio. Por isso mesmo tão opostas elas se entendiam, se completavam. Uma achava na outra aquilo que faltava em si. E não me venham com essa que somos completos! Como posso explicar? Uma peça de um quebra-cabeça é um ser completo em si, mas ela só ganha sentido e dimensão combinando-se e completando-se com outras peças.

Mas do que adianta tantas explicações? Vamos aos fatos:

Era uma vez uma fada, que ao contrário das suas companheiras não tinha nenhuma resposta, mas muitas perguntas. E enquanto todas as outras ficavam festejam e compartilhando todas as suas certezas sobre a vida e sobre o mundo, ela queria saber o que havia além daquele círculo estreito em que as fadas viviam. E apesar de a vida toda tentarem tirar isso de sua cabeça, um dia a jovem fada saiu pelo mundo atrás de respostas. Ninguém percebeu sua ausência, pois todas estavam preocupadas demais com suas próprias certezas.

Ela voou, voou e voou, e por mais que buscasse, não encontrou resposta alguma, só mais perguntas. E ela se sentia muito angustiada, como se não pertencesse a lugar algum, como se fosse completamente sozinha no mundo. Cansada daquela vida sem sentido, decidiu que daria um fim a sua existência, que já havia se tornado um fardo.

E voando, meio cabisbaixa, como se carregasse o peso do mundo em suas costas, ela avistou um rio e pensou "pois bem, é ali que darei fim a minha vida".

Ficou sobrevoando aquelas águas calmas e límpidas, sabia qual seria o fim daquela história, mas não tinha pressa, e enquanto pensava em como faria acontecer sua vontade, aproximou seu rosto da água e viu seu reflexo, a muito tempo ela não se enxergava. Mas ela estava parada e o reflexo começou a se mover em direção a superfície! E foi com grande espanto que ela viu aquilo que parecia ser meramente um reflexo seu ganhar vida própria e brotar da água dizendo "oi!".

A fada recuou assustada, mas a sereia com seu jeito brincalhão, sorriu espoleta e tentou puxar assunto:

- Você é um tipo diferente de vaga-lume?
- Não! Eu sou uma fada! - disse que pequena alada mau-humorada
- Ual! Pensei que vocês não passavam de histórias para as crianças!
- E que tipo de peixe estranho é você?
- Não sou um peixe, sou uma sereia!
- Também não sabia que vocês existiam! E olha que já voei muito por ai!
- É porque as sereias nunca vem até a superfície. Mas eu sou tão encantada com as coisas aqui de cima, que sempre dou um jeito de vir...
- E nós fadas nunca saímos do nosso reino, eu fui embora porque procurava respostas...
- E você achou alguma?
- Não... Só mais perguntas... Não vejo sentido na minha vida. Minhas irmãs se divertem com festas e suas certezas absolutas, já eu não consigo encontrar nada que me satisfaça, nenhum lugar ao qual eu pertença!
- Eu também me sentia assim...
- E o que você fez?
- Você vai achar idiota... Você que viajou o mundo todo, e tem perguntas tão maiores...
- Conte mesmo assim...
- Eu aprendi a me amar... E apesar de ninguém entender ou aprovar eu sempre subir para a superfície, eu faço, porque isso me faz bem... Você deveria procurar aquilo que te traz paz...
- Eu nunca consegui achar essa paz...
- Você disse que iria por um fim a sua vida, certo?
- Sim...
- Então você não deve estar com muita pressa para um outro compromisso, certo?
- Sim...
- Então sente-se comigo - e a seria eu dizer isso, sentou numa pedra na beira do rio
- Eu sou uma criatura do ar... Nunca sentei em pedras!
- E eu sou uma criatura da água! E onde mais conseguiríamos nos encontrar?  - e ao dizer isso riu novamente daquela risada gostosa...

E assim todos os dias as fadas descia dos céus, e a sereia subia da profundezas das águas para se encontrarem naquela pedra... E lá elas falavam sobre tudo, ou riam de bobagem, ou simplesmente nada diziam, uma simplesmente existindo ao lado da outra, mas nunca a existência era tão doce como nesses momentos.

O que pouca gente comenta, é que tanto fadas como sereias tem o corpo muito frio, faz parte de sua própria natureza, mas aqueles encontros foi criando uma chama dentro delas... Algo que foi se irradiando, e tornava seus corpos ardentes, flamejantes, um fogo invisível, mas que faria inveja a qualquer salamandra!

E elas desejam a cada dia mais aqueles encontros, e tudo que eles traziam, mas tinha medo, muito medo... Era elas contra o mundo e sentindo algo que não sabiam explicar ou compreender.

Então um belo dia, entre um encontro e outro a fada pensou sobre seu passado, sobre o presente e sobre o futuro... Ela e sua bela sereia jamais teriam um futuro juntas, então para que prolongar aqueles encontros? Ela tinha medo de machucar a seria, pois nada no mundo lhe era mais precioso. Então aquele dia ela não apareceu, se escondeu atrás de um árvore, e viu surgir a sereia ansiosa para lhe ver, e viu a ansiedade se transformando em decepção e depois em tristeza...

Então, todos os dias a sereia subia para a superfície no mesmo horário esperando por sua fada, e a fada todos os dias se escondia para admirar sua amada surgindo das profundezas do rio. E era cega ao fato que em sua ânsia de não machucá-la, acabava machucando...

Depois de algum tempo a sereia deixou de aparecer, mas a fada continuava a esperá-la ansiosamente. Porém, com aquela ausência completa, ela perdeu novamente aquela chama que fazia ela ter vontade de se manter viva... Ela foi se esquecendo de quem ela era, e de quem poderia ser...

Sentou-se então na pedra em que costumava se encontrar com a sua sereia, amarrou um peso prendendo suas pernas e se jogou no rio. Por ser uma criatura do ar, não precisou de muito tempo para ser sufocada pela água e perdeu a consciência. Era o fim.

Sua consciência foi voltando aos poucos, com a vista embaçada, precisou piscar algumas vezes para tentar enxergar o cenário e compreender o que estava acontecendo: ela estava encharcada, novamente deitada na pedra com a sereia ao seu lado, passando a mão em seus cabelos...

- Não foi jutos você me deixar... Não me permitir escolher o que era melhor para mim... Mas seria mais injusto ainda você me roubar você para sempre!
- Você não entende...
- Não! Você que nunca entende nada! Eu não sou uma fada e eu nunca vou poder voar com você! Mas todos os dias eu vinha para a superfície te encontrar! Porque você não pode me aceitar como eu sou? Aceitar a minha natureza?
- Me desculpa...
- Sei que não é fácil para você, mas também não é para mim... Entendo que você quisesse alguém para voar o mundo todo com você, e eu queria alguém para nadar comigo... Se você encontrasse uma fada vocês poderiam voar pelo mundo todo juntas, e se eu encontrasse uma sereia poderíamos juntas explorar os 7 mares... Mas enquanto formos eu e você, estaremos sempre presas a essa pedra...
- Por isso eu fui embora... Eu queria te deixar livre...
- É isso que você não entende! Se é nessa pedra que posso estar com você, então é ela que será meu lar! Prisão é me obrigar a ficar longe de você... E eu só vou embora se você disser que não me quer mais!
- Eu viajei o mundo todo, vi coisas que você nem acreditaria, e de todas as belezas e riquezas dentes mundo, para mim, não há nada mais belo e mais precioso que você. Não há nada que eu deseje mais...
- Então você fica?
- Fico mais um dia...
- E depois?
- Eu fico mais um dia novamente!

E elas sorriram, mais nada precisava ser dito, pois desta forma elas descobriram que quando se ama, uma pedra pode ser maior que o mundo todo.




Um comentário:

  1. Que lindo Camila!!!
    Apesar de eu ser da água me identifiquei com a sua Fada, seu texto explana uma certa parte do que venho vivendo ultimamente, não na questão do romance, mas no ponto da escolha em ficar ou ir....decidi ficar!

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